Wednesday, August 13, 2025

A montanha das placas-cantantes

 


A caminhada para o alto de nossa alma (o mais justo, verdadeiro e belo sentido de vida) se assemelha à subida de almas-placas até o topo de uma montanha: Há trechos com pavimentos e trilhas nas matas mais fáceis de trilhar; mas há também picadas incertas e matas fechadas a espera de desbravar. As almas-placas, ou apenas placas, são pessoas que expressam, no dizer e/ou no fazer, o caminho que pretendem seguir a medida que percorrem a cordilheira do Ser.


Quem da planície olha o belo monte vê beleza indistinta em toda ela e alguns desejam subi-la. Os largos e confortáveis pavimentos, que hora sobem e hora descem, são os preferidos pela maioria de seus viajantes. Em meio à montanha há diversas almas-placas a indicar os mais variados caminhos. Alguns muito diferentes e aparentemente opostos e outros parecidos. Mas dizem que todos levam ao topo. Em minha placa copiei, apaguei, recopiei, revisei e segui várias trilhas junto a outras placas com o melhor que fui dispondo de olho e coração, de Ciência, Arte, Política e Filosofia, de fé e razão. Com elas bebi leite por dias, meses e anos até que comer carne pudesse me fazer bem. Algumas trilhas indicadas pelas almas-placas começaram pavimentadas e terminaram em matas fechadas ou precipícios, outras começaram como tênues picadas de difícil acesso mas a muito custo, de mãos dadas, descobri com outras almas-placas belas clareiras. Algumas placas que eu copiei seguiram adiante onde eu não tinha coragem de avançar subidas. Outras eu segui só ou com poucas outras placas.


Numa das trilhas, espalhadas em grupos sempre nas partes mais lindas, ricas e abundantes da floresta, ouvi os mais belos cantos que ecoavam em meio à montanha. Desviei-me e aproximei-me das placas cantoras. Eram as mais belas, pintadas e ornadas sob as formas mais antigas, tão belas nas formas quanto nos caminhos que propunham para o alto. Todas pareciam beber leite mas, apesar de indicarem os mais belos caminhos, geralmente permaneciam alí, no mais visível e chamativo começo da caminhada. Suas placas diziam, entre outras idéias, a principal, de uma Grande Mestre, e que guardei pra mim: **Siga sua voz do silêncio para o caminho ao topo promovendo a Unidade na diversidade, não descansando enquanto houver lágrimas a enxugar e sofrimentos a aliviar, pois não há nem pode haver felicidade para quem ascende enquanto houver uma única pessoa infeliz no mundo."**   As copiei avidamente e as incorporei em minha jornada pois desde a juventude minha alma expressou e cantou o verso "...e o Todo como quesito à parte remanescem em seus simplismos." em ressonância com estas diretrizes. Ideias estas que emergidas com outras eu as tenho cantarolado desde então na forma deste canto do Filosopássaro:


Um pássaro corta o nevoo céu a gorjear. 

Cruza solitário o ar sob a pétrea selva a chorar. 

Canto de liberdade sibila em seu bico. 

Louvor singelo à remanescente Natura sai de seu peito. 

Sobrevoa o profano, 

Escrutina o humano. 

E humildemente escancara nossa pseudo-riquesa espiritual. 


Pássaros solitários cruzam o gorjear humano, 

Cantam a ascensão da razão ante o profano. 

Louvor nevoo ao real amor sibila em seus peitos. 

Sobrevoam apenas, 

Não encontram pouso... 

Apenas rejeitos. 

Cruzam a selva a escrutinarem os egoísmos. 

**E o todo como quesito à parte remanescem em seus simplismos**. 


Com as fórmulas que aprendi com as placas-Shivas de outrora, as apliquei em minhas últimas cópias. As submeti aos decompositores daquela deusa indu, imprescindível para o ciclo de renovação da vida. Desta deusa, força da natureza, que quando plasmada na Consciência humana, possibilitou pôr à prova natural a decomposição dos mitos às pré-filosofias e destas à melhor Ciência, Arte, Filosofia e Religare, todas unas em crescente esclarecimento, essências cada vez mais testadas e verificadas! Pois só a decomposição daquilo que não se sustenta possibilita fazer brotar o novo que emerge alimentado pelo estrume do novo enviesado, do velho necrosado, de um ou outro menos preciso e até mesmo enganoso.


Enquanto bailava com as placas cantantes eu as convidei para descer a montanha e dar às mãos àqueles que, nascidas na penúria dos desertos das planícies ou no árido sopé do monte, não tinham ânimo nem para começar sua escalada. Me apontaram alguns poucos cantantes que já faziam isto, desciam nas proximidades para trazer ao menos algumas crianças para o Bem.  -Trazer pra cá? E tão poucas para tantos e inumeráveis grupos de almas-placas-antantes? Porque não levamos danças, abundâncias e cantorias também ao sopé e ao deserto e assim lhes ensinemos como fazer florescer a base e fazer crescer oásis lá mesmo?.... -Não! -Elas exclamaram assustadas. -Seria perigoso demais criarmos grupos cantantes lá, pois são àreas perigosas para as cantantes almas-placas andarem! A mais idosa anciã se seu grupo, a que mais replicava os ensinos da Grande Mestre, baixou a cabeça, envergonhada...


Então me pus a aplicar as fórmulas das placas-Shivas às paLavras, as oraAções, e peneirei o que havia de pás e lavrados, semeaduras, frutos e filtrei o que havia de orar (falar) e de ação: oração, a praxe, o falar-fazer ideal e real, possível, verificado por mim e, ou, por quem trilhou antes de mim, até que restasse apenas os contornos energéticos puros das trilhas copiadas, sem os excessos de ornamentos e floreios pois, assim, minhas novas trilhas em minhálma-placa ficariam mais claras para me guiar. No processo bebi leite com elas enquanto comia e lhes oferecia a carne que tinha. Algumas engüiaram só com o cheiro do sangue e outros tentaram comer da carne que lhes ofereci e, passando mal, parece que se afastaram das demais.  Isto não agradou aos mais veteranos copistas daquele grupo de placas. Esta minha alma-placa, percebendo que talvez ela não possue polidez necessária para  compartilhar meu pão com elas sem lhes provocar repulsa, me afastei delas. Me afastei mesmo ainda havendo o que delas copiar e depurar para internalizar. Assim, deixo-as em paz com seus belos cantos e dedicações. 


Deixo-as em suas dedicações que parecem ser mais para manter as formas que atraem do que a difícil tarefa de dar as mãos às almas-placas que não tem forças ou tintas ou cordas para ajudar a manter seus cantos, suas harpas e a beleza das placas que apontam para o alto. Copiei as rotas das suas placas apontam para a trilha de dar as mãos e buscar unir mesmo na diversidade, unir mesmo quem não tem forças próprias, tintas ou cordas onde quer que esteja na montanha ou ainda fora dela. Acredito na rota e a busco realizá-la em mim. Sigo agora adiante em minha Jornada que, quem sabe até o alto, devo descer e subir muitas vezes, mas não quero nunca me deter nem me afastar dos ensinos de Shiva que me honra em ajudá-la um pouco em seu movimentar entre a vida e a morte no ciclo necessário rumo ao esclarecimento do melhor rumo ao mais justo, verdadeiro e belo sentido de vida... 


Aos que ficam desejo as melhores copias e jornadas nas trilhas que seguirem ou ficarem. Almas-placas sinalizando para o alto são imprescindíveis, principalmente em uma montanha com tantas placas apontando pra baixo! Então apontar pra cima, mesmo sem se moverem muito, sem se afastarem muito do conforto e da abundância da mais enriquecida parte da montanha, é uma missão bonita!


Agradeço às mais belas almas-placas deste início de jornada com quem tanto aprendi. Desculpem os barulhos de meus cinzéis talhando os mármores de minh'alma-placa e que, por isto, possam haver atrapalhado vossa música e sinto muito pelo mal cheiro enquanto eu limpava, com ajuda de Shiva e seus decompositores, os excessos desnecessários que copiava na alma-placa. Nos encontramos no alto, na Unidade onde, como nos ensinou o Filósofo-imperador Marco Aurélio, há beleza até na baba de um javali!


Abraços fraternais!


Daimon Li Veritas Attritor ad Lux!

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